29 de novembro de 2012

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A fúria e o furo de Alain Delon






Tudo pronto ontem para o dueto de Alain Delon com a cantora pop Shy’m, no programa de televisão da France 2, Simplement pour un soir. Simplesmente, não apareceu. O motivo? Em vez de um convite comme il faut - escrito INVITATION - Delon recebeu um simples papel em formato de CONVOCATION, com informações práticas: local, horário de gravação, etc. Não gostou, achou falta de politesse, se irritou e declarou solenemente : « On ne convoque pas Alain Delon ! On invite Alain Delon ! ».

É isso mesmo: o par de olhos azuis mais famosos do cinema francês não é para ser convocado, mas sim convidado. Falta de politesse à parte, a fúria e o furo de Delon se resumem, não ao dueto Delon e Shy’m, mas ao dueto dos significantes “convocação" e "convite". Na verdade, o bafafá ocorreu por obra e força do que Lacan chama de "significante". 

Uma análise serve para que a gente ouça a verdade do que é dito por nós: a função exclusiva do analista é a de ouvir e nos fazer ouvir. Isso porque uma palavra, a qual significa aproximadamente a mesma coisa para os falantes de uma mesma língua, na prática analítica significa algo totalmente singular para um sujeito e não para outro. É esse o sentido de "significante" em Lacan: algo que representa cada um de nós, nos identifica.  A frase de Delon dita no divã, propiciaria ao analisando ouvir a significação específica, absolutamente singular, atrelada aos significantes "convocar" e "convidar". A fúria e o furo de Delon indicam que ele não se sente nada representado pelo significante convocation, este não o identifica, muito pelo contrário, o exclui. Por isso, deixou Shy’m e todo mundo a ver navios. 

Afinal, um Delon convocado equivale a qualquer Delon.
Convidado, só um. 

Madonna já profetizou: "Você pode ser um lindo matador... Mas nunca será Alain Delon."

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