Política
é aquilo a que nos destinamos por nossa própria condição enquanto
seres precários, afetados e dependentes uns dos outros. Como diz
Aristóteles “o homem é um ser político e está em sua natureza
viver em sociedade”. Portanto, se a Política tem como fundamento a
precariedade humana, a ética psicanalítica tem paralelamente uma
ética política: o psicanalista tem como dever combater qualquer
discurso dogmático que recuse o direito à singularidade,
subjetividade, particularidade. Isso supõe um espaço de liberdade,
de democracia, onde valores que preservem a singularidade de cada um
sejam afirmados acima de qualquer coisa, um ESTADO LAICO
FUNDAMENTALMENTE.
A
cidade do Rio de Janeiro está a um passo de eleger, segundo
pesquisas, um bispo da Igreja Universal do Reino de Deus, Marcelo
CRIVELLA, que aliás, soube hoje, é PRIMO de Edir Macedo, que
dispensa apresentações. Não me cabe, nem como pessoa, muito menos
como filósofo e psicanalista, discutir credo ou opções religiosas:
ser adepto do criacionismo, como no caso de Crivella, é inteiramente
de foro íntimo de cada um. Em política, todavia, trata-se não de
foro íntimo, pelo contrário, trata-se sim, de FORO PÚBLICO.
De
minha parte, penso ser INADMISSÍVEL, por tudo que é notório no
tocante aos negócios espúrios e práticas indecentes ligadas a essa
EMPRESA - porque é disso que se trata: uma empresa pseudoreligiosa
que manipula a fé dos incautos, metendo a fé deles no saco e a mão
no dinheiro deles -, que tenhamos como representante da pólis, seja
o Rio de Janeiro ou qualquer outra, um avatar do fundamentalismo
religioso, altamente conservador (leia-se: que não aceita o que é
diferente dele), racista, homofóbico e o que é pior, sem
escrúpulos. Ademais, regurgita ardil e sarcasmo bem ao estilo
oratório dos pastores da Universal, procurando sempre “dourar a
pílula”. A título de exemplo, Crivella fez aliança com o clã de
Anthony Garotinho, ex-governador do Rio, já condenado por formação
de quadrilha, pretextando que “a política precisa de alianças.
Ninguém pode ganhar uma eleição sozinho”. Com isso, conseguiu
mais que dobrar seu tempo em televisão. Apenas um detalhe. O grosso
da aliança a gente não sabe, ou melhor, sabe.
A
Filosofia e a Psicanálise me mostraram na carne que cada um deve ter
o direito de inventar o seu modo de ser e “não ceder do seu
desejo”, como diz Lacan. Isso implica responsabilizar-se.
Responsabilizar-se é não apenas reconhecer o que se diz e assumir o
que não se conhece (o desejo), mas também assumir o que se diz e o
que se faz diante do OUTRO na pólis. Ou seja, no MEU modo de ser eu
ME implico e implico o OUTRO. Bem diz o ditado: “a liberdade de
cada um termina quando começa a do outro”. Um professor de
Filosofia da Sorbonne, Robert Misrahi, dizia: "pas de liberté
aux assassins de la liberté". Ele está certíssimo. Não se
deve dar voz a alguém cuja palavra aniquila a liberdade alheia.
MUITO MENOS VOTO.
Estamos
a poucos dias do primeiro turno das eleições. Quem acompanha meus
escritos sabe que não faço panfletagem partidária, tampouco me
disponho a convencer nem a demover ninguém. Esforço-me sim, em
interpretar com meus olhos o mundo à minha volta, o que requer não
somente pensar uma ideia, mas aprofundar-me no próprio terreno onde
a ideia se enraíza, e a partir daí, agir. Esse é o esforço do
filosofar no sentido da praxis. Pois bem.
Há
uma constatação, eu diria até, uma imposição de ordem prática:
o candidato Crivella, disparado nas pesquisas, JÁ ESTÁ no segundo
turno. Muitos hão de se alegrar com isso, eu não. Sinto-me num
impasse. O que fazer diante disso? Sentar e chorar não resolve nada.
Ficar martelando nas redes sociais as falcatruas do candidato também
não: quem já o escolheu está exercendo o direito que é seu, por
motivos que lhe dizem respeito, e nada posso contra isso, senão
lembrar o dizer de uma amiga, que publiquei esses dias: "A
pessoa põe sabonete na boca; se tirar, ela reclama".
A
questão que eu coloco a mim mesmo, e que cada um que não quer
Crivella como prefeito do Rio - por entender que a política é
fundamentalmente um espaço LAICO, em DEFESA DA SINGULARIDADE de cada
um - deve, penso eu, se colocar neste momento é: qual dos candidatos
tem MAIS E MELHORES condições intelectuais, emocionais e morais
para, num possível segundo turno, combater, como diz meu professor,
um “assassino da liberdade”?
Minha
resposta é: Marcelo FREIXO. Cada um pense e responda como entender.
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