23 de março de 2013

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O que fazer com Marco Feliciano?


René Magritte, Espelho falso

Eu jurei que não ia mais falar nesse assunto. Mas fica aqui jurado de novo: é a última vez. Que assunto? Claro, as boçalidades do Pastor Marco Feliciano, eleito Presidente da Comissão de Direitos Humanos, mas que, como todo mundo sabe, mete mesmo a fé no saco e a mão nos Dinheiros Humanos. Cartão de crédito, irmão, serve também mas só se for com senha, senão não entra no Céu. Vamos lá: 

“Quando você estimula uma mulher a ter os mesmos direitos do homem, ela querendo trabalhar, a sua parcela como mãe começa a ficar anulada, e, para que ela não seja mãe, só há uma maneira que se conhece: ou ela não se casa, ou mantém um casamento, um relacionamento com uma pessoa do mesmo sexo, e que vão gozar dos prazeres de uma união e não vão ter filhos. Eu vejo de uma maneira sutil atingir a família; quando você estimula as pessoas a liberarem os seus instintos e conviverem com pessoas do mesmo sexo, você destrói a família, cria-se uma sociedade onde só tem homossexuais, você vê que essa sociedade tende a desaparecer porque ela não gera filhos”.
Agora chega.
Porra, não tem fim essa merda! - exclama-se um amigo a quem prezo muito. Se volto a falar no assunto pegando carona no desabafo de meu amigo, é porque penso que  há uma saída sim. Não me refiro evidentemente às boçalidades do pastor. Bem que dá vontade, inspirado no Rei da Espanha, de dar-lhe um basta: Por que não te calas, Marco Feliciano? Mas não adianta. Dele não se pode esperar outra coisa senão isto: merda.  Refiro-me sim, à maneira de lidar com ele. 
Quem se lembra de Jean-Marie Le Pen, pai da loiríssima Marine Le Pen, olhos azulíssimos, do partido francês “Front National”, rasgadamente xenófobo, racista e antissemita? Pois bem, Le Pen dentre tantas absurdidades, se obstinou anos a fio em bradar aos quatro cantos do mundo - no rádio, na televisão, no Parlamento Europeu, onde quer que fosse - que “as câmaras de gás foram apenas um detalhe na história da Segunda Guerra Mundial”. A cada vez a indignação era geral, vaias, protestos e condenações  choviam de todos os lados. E a cada vez Le Pen se aproveitava cinicamente disso, dizendo-se vítima de perseguição, de “acusações difamatórias”, exigindo de seus inimigos que tivessem a “boa vontade” de pedir a ele “desculpas por uma acusação que é mentirosa". Um belo dia foi condenado a pagar milhares de euros como indenização. Le Pen, mais uma vez, não perdeu a chance, fez-se o mais oprimido e amordaçado dos mortais:  "isso prova o estado no qual se encontra a liberdade de expressão na Europa e na França”. E seguia a sorrir como o Pastor Feliciano. Afinal Le Pen, muito antes do Pastor, foi o primeiro a se dar conta de que, enquanto caíam de pau nas monstruosidades que ele alardeava, seu rebanho de eleitores e fiéis não parava de engordar. 
Aí, é o caso de exclamar como meu amigo: Porra, não tem fim essa merda! Fim, provavelmente, não tem. Marine Le Pen nos dá mostras disso: com aura de Joana d’Arc repaginada, encabeça a cruzada de seu pai contra o que ela qualifica de “ocupação do território”, com frases provocadoras e islamofóbicas. Mas, a questão que nos interessa hoje: o que fazer com (as imundícies de) Marco Feliciano?   
O mesmo que a mídia francesa fez com Le Pen quando finalmente se deu conta de que ele só queria aparecer: não lhe deram mais voz, ou, quando era o caso, o mínimo possível. Desde então, pouco, ou quase nunca mais se viu ou ouviu Le Pen na televisão ou no rádio. É simples. Naturalmente, pode-se objetar que os dois princípios fundamentais da democracia, tal como os gregos a conceberam, são a isonomia e a isogoria, isto é, igualdade de leis e de expressão para todos os cidadãos. Mas justamente aqui uma reflexão se impõe: um homofóbico, um racista, por exemplo, têm o direito de se expressar? Bem diz o ditado: “a liberdade de cada um termina quando começa a do outro”. Um professor de Filosofia da Sorbonne dizia: pas de liberté aux assassins de la liberté. Ele está certíssimo. Não se deve dar voz a quem cuja palavra aniquila a liberdade alheia. Ademais, Marco Feliciano e Le Pen não são trouxas: sabem muito bem que quanto mais estardalhaços fizerem, mais espaço terão para fomentar o ódio e o preconceito, e o que é mais importante para eles, angariar votos de quem a eles se assemelha. Se, evidentemente, isso não resolve de todo a questão - e de fato não resolve -, pelo menos deixamos de servir de arautos à burrice maquiavélica desses canalhas e de espelho a seu narcisismo patológico e eleitoreiro. O que não significa colocar uma venda nos olhos tampouco perdê-los de vista, muito pelo contrário: olho neles! Se às nossas vistas fazem o que fazem, dizem o que dizem, o que dirá longe de nossos olhos. 
Agora é para valer, está jurado. Marco Feliciano, nunca mais. O poeta Mário Casariny é meu conselheiro e guia:
“Faz-me o favor
Faz-me o favor de não dizer absolutamente nada! 
Supor o que dirá 
Tua boca velada  É ouvir-te já."

Um comentário:

  1. hahaha, muito bem articulado. Mas vc devia mandar essa sugestão para a Daniela Mercury que, desavisada, fez da vida privada um marketing profissional, hahaha.

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